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A influência francesa na cidade de São Paulo, no final do século XIX e século XX-parte 3

A influência francesa na cidade de São Paulo, no final do século XIX e século XX-parte 3

Sonho Realizado

 

A troca de correspondência entre dois mundos tão distintos e separados pelo Atlântico, é fruto da ambição de um homem chamado Pierre- George Latécoère, um industrial de Toulouse. Seu sonho: ligar de avião a França e a América do Sul, em pleno 1918.

Fundado em 1917, por Latécoére, o grupo produziu seus próprios aviões até 1950.

A ideia inicial prevê o uso dos Salmsons que sua empresa produz durante a primeira Guerra Mundial. O aparelho tem capacidade de ligar Toulouse a Dakar. No entanto, a distância de 3.000 quilômetros entre o Senegal e o Brasil só pode ser percorrida via marítima.

Latécoère começa a trabalhar com seu projeto “a Linha“ .

Os problemas técnicos e a formação dos pilotos ficam a cargo de Didier Daurat que, a partir de 1925 contrata homens de renome como Mermoz, Guillaumet, Reine e Antoine de Saint-Exupéry.

 

Didier Daurat

O empreendimento tem três trechos possíveis. O primeiro prevê a ligação entre a França e o Senegal, atravessando o deserto da Mauritânia. Depois, entre Dakar e Natal, trecho cujos aviões da época não têm autonomia para sobrevoar.

Deserto da Mauritânia

Dakar        
Natal

Isso demanda a invenção de um meio de transporte capaz de percorrer esses trajetos. Finalmente é preciso implantar voos dentro do continente sul-americano, região pouco conhecida e totalmente desprovida de infraestrutura aérea.

A primeira etapa é realizada entre 1918 e 1923. No ano seguinte, Latécoère decide preparar e implantar os trechos a partir de Natal, na costa do Brasil, do Uruguai, da Argentina. Resta a travessia do Oceano.

Em primeiro de março de 1928, a distância é percorrida com a ajuda de seis avisos (navio pequeno), com pouco ou nenhum armamento, usado para o transporte de correspondência, ordens e outros documentos colocados à disposição da Compagnie Générale Aéropostale, companhia francesa de serviço aéreo postal, pela Marinha Nacional. É assim que nasce o primeiro serviço semanal de correio entre a França, o Brasil e a Argentina, com uma travessia marítima de 8 dias.

Para resolver o problema da lentidão dos avisos, Durat manda instalar flutuadores no hidroavião Laté 28. Concretiza-se assim o sonho perseguido desde 1918: o primeiro serviço 100 por cento aéreo de transporte postal entre Toulouse e Santiago do Chile.

Em 12 de maio de 1930, o Comte de La Vaulx, pilotado por Jean Mermoz, percorre, sem escala, os 3.200 quilômetros de travessia Atlântica entre Saint- Louis du Sénégal e Natal. O voo dura 21 horas e 24 minutos e carrega 135 quilos de correspondências.

No mesmo ano, há problemas políticos no país, Getúlio Vargas e seus partidários organizam um golpe militar. Sua política centralizadora irrita a elite paulista.

A revolta explode em julho de 1932, com o apoio da população e da imprensa. O governo revolucionário paulista requisita à Rhodia a fabricação de lança-perfumes metálicos. A empresa adapta suas máquinas para a produção de munição.

Após 3 meses de luta, os paulistas se rendem.  Estatísticas oficiais registram 830 mortos. Derrotada, a oligarquia paulista necessita de uma produção que lhe devolva a primazia nacional. Ela precisa formar uma nova elite política e cultural e restaurar os princípios liberais e democráticos do país.

A Ideia de criar uma universidade estadual surge no final da Guerra como uma forma de fortalecer o estado. Este fator é decisivo para a criação da Universidade de São Paulo (USP) em 25 de janeiro de 1934.

Mais do que um centro de ensino, a USP surge como um dos instrumentos da modernização conservadora do Brasil.

Sua criação conta com apoio de documentos estrangeiros, como a missão de professores franceses encarregada de implantar diversos cursos.

Georges Dumas, professor de sociologia da Sorbonne, se compromete com Mesquita Filho, diretor do jornal “O Estado de São Paulo” a enviar anualmente, profissionais de várias universidades da França. Jovens intelectuais do país desembarcam em São Paulo, para lecionar na Universidade.

Mais tarde, muitos se tornam célebres, a exemplo do antropólogo Claude Lévy-Strauss; Émile Léonard, o primeiro acadêmico a estudar o protestantismo no Brasil; Paul Arbousse Bastide, que ensina ciência política; Roger Bastide entre outros, cujas aulas e pesquisas contribuem para a formação das práticas e do pensamento do ensino no Estado.

A USP se expande. Muitos departamentos ligados principalmente às Ciências Exatas e Biológicas da FFCL ganham autonomia, formando institutos ou escolas próprias, como o Instituto de Física ou o Instituto de Matemática ou Estatística.

A Universidade reúne faculdades de alto nível já existentes, como a do Largo São Francisco (de Direito), da Escola Politécnica e da Faculdade e Medicina.

No mesmo ano em que a USP inicia suas atividades, a Aliança Francesa instala-se na rua Boa Vista, no centro da cidade. O Conde Maurice de Périgy dirige a instituição em uma São Paulo que se transforma no maior polo urbano da América Latina.

Entretanto, não é apenas a educação que avança no país.

A saúde também se fortalece com a ajuda dos franceses. Em 1936, a Roussel Uclaf compra o laboratório brasileiro Silva Araújo, dando origem ao SARSA (Silva Araújo Roussel) com sede no Rio de Janeiro e famoso nacionalmente pela produção e venda de itens como o Vinho Reconstituinte Silva Araújo, um tônico lançado em 1879 que levava vinho do Porto na sua composição original. 

Seu ingresso no mercado brasileiro traz mais expertise, tecnologias e novos processos ao laboratório, que passa a produzir medicamentos como Aderogyl, Calcigenol, Targifor e Targifor C.

 

Vinho reconstituinte Silva Araujo

 

Intercâmbio  comercial

Sempre crescente, a presença dos franceses em São Paulo ocorre em razão do importante desenvolvimento econômico do grande centro paulista, que acarreta na implantação de inúmeras indústrias e no crescimento dos intercâmbios comerciais com o país.

Em 1933 é instituída a Union des Commerçants et Industriels Français de São Paulo. A ideia de constituir esse grupo de indústrias e comerciantes franceses, mais tarde resultante na Câmara do Comércio  & Indústria Francesa de São Paulo, cujo presidente fundador é o francês Henri Albaux, se concretiza logo em seguida.

Ela é oficialmente reconhecida pelo governo francês em 5 de março de 1935.

Com a guerra, o bom desempenho da Rhodia no Brasil é impactado; a importação de matéria prima da Europa, suspensa e alguns funcionários, por sua vez, recrutados.

Em plena guerra, o francês Pierre Avril, deixa seu país, ficando detido em Dakar, no Senegal.

Em 1941 ele desembarca no Brasil a fim de dar início à produção de acetato de celulose na Rhodia Química. Trata-se de uma matéria-prima voltada ao abastecimento da Companhia Brasileira Rhodiaceta produtora de fios artificiais.

Seu esforço assegurará que a empresa se desenvolva, apesar da guerra.

Os tecidos produzidos a partir do acetato de celulose conquistam rapidamente o mercado e fazem a fama das marcas Rhodia (fio brilhante) e Albène (fio mat).

A produção do acetato de celulose leva a Rhodia Química a adquirir a Fazenda São Francisco em Paulínia (SP) em 1942, por 3.500 contos de réis. O intuito é produzir etanol de cana de açúcar para suprir as necessidades da usina química de Santo André.(SP)

Rhodia em Paulínia

Em decorrência da presença de submarinos alemães na costa brasileira durante a Segunda Guerra mundial é impossível transportar por navio o etanol vindo do Nordeste.

Em tempos de racionamento a Rhodia transforma a Fazenda produtora de café e substitui toda a sua plantação por cana de açúcar. Na época, a atitude é considerada fora de contexto. Entretanto, essa ousadia impulsiona a indústria álcool química no estado de São Paulo.

Com o término do conflito mundial em 1945, a companhia já fatura 200 milhões de dólares e sua produção química farmacêutica e têxtil se encontra em plena expansão.

E assim, no pós-guerra, a França, depara com uma empresa em franco desenvolvimento.

O Brasil, por sua vez, se vê diante de uma companhia vital para o seu futuro.

Para muitas brasileiras a palavra soutien é sinônimo de Valisère, quando os direitos de comercialização são adquiridos pelo grupo Rhodia.

                                     

Valisère

Além da vestimenta ganhar tamanhos que variam de A a D; ela ainda incorpora novos materiais e modelos.

Inicialmente com apenas 20 funcionários e produzindo cerca de 20.000 peças em seu primeiro ano de funcionamento a Valisère torna-se um sucesso entre as mulheres.

Futuro Traçado

Desde 1896, a vidraçaria Santa Marina traz sinais que apontam para o futuro.

Vila Velha formada por operários da Vidraria Santa Marina

Os primeiros operários especialistas em vidro chegam da França para trabalhar na fábrica e deixam sua marca até na nomenclatura das atividades, o que perdura por muito tempo.

1892 foi quando começaram as instalações da antiga Vidraria Santa Marina na cidade de São Paulo.

A Santa Marina tem um papel importante na urbanização da região Oeste da cidade de São Paulo e na unidade Saint-Gobain na Água Branca.

Sain-Gobain

Conquista do céu

Em 1951, o governo francês resolve incentivar a criação de uma alternativa para o DC-3 da McDonnel Douglas. A solução mais interessante é a construção de um bimotor a jato, inédito no mundo. Tarefa imposta pelo Ministério da Aviação, visibiliza-se uma aeronave que transporta até 65 passageiros, a uma velocidade de 700 quilômetros por hora.

Vence o projeto da Société Nationale de Constructions Aéronautiques Sud-Aviation, cujo modelo pode ser usado tanto em conexões como em viagens transatlânticas.

Trata-se do Caravelle, uma alusão dos navios usados no período dos grandes descobrimentos.

Foi o primeiro avião comercial a jato de curto / médio percurso produzido pela empresa francesa Sud Aviation.

Seu primeiro voo foi no dia 27 de maio de 1955.

Caravelle

Nos anos 1960, a aeronave torna-se o primeiro jato a entrar em serviço no Brasil por iniciativa das empresas Cruzeiro do Sul, Varig e Panair.

Varig

Cruzeiro do Sul 

De braços abertos

No Rio de Janeiro, o Cristo Redentor, construído entre o final da década de 1920 e o início de 1930, também leva um toque francês. Assinado pelo engenheiro Heitor Costa e Silva e com desenho final de Carlos Oswald, a escultura tem suas mãos e cabeça modeladas na França pelo polonês Paul Landowvski, lá radicado.

Cristo Redentor

Poderia citar muitas outras influências francesas no nosso querido país, porém, 2022 está terminando e gostaria de dar-lhes alguns dias de férias, retornando na primeira sexta-feira de 2023.

                             

Para isso estou aqui desejando-lhes um feliz e Santo Natal com muita saúde, alegrias mil e com grandes esperanças para que 2023 seja um ano abençoado! 

Conto com vocês para continuar a ler “Helena Landell-Curiosidades Culturais”.

Helena Landell

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