(Texto da professora e jornalista Célia Siqueira Farjallat- publicado no jornal de Campinas, “Correio Popular”)
Ninguém melhor do que o Professor Ignácio Carvalho Landell para simbolizar a figura do Professor, daquele que dedica toda a sua vida ao trabalho persistente, obscuro, tantas vezes incompreendido e, no entanto, da mais alta importância: educar.
Simples, culto e de uma indomável força de vontade, o professor Landell é catedrático duas vezes: de Desenho e de Trabalhos Manuais. Começou modestamente sua carreira em 1930, como mestre primário na zona rural, em Conceição de Monte Alegre, na escola de Ribeirão Bonito. Ora, quem já lecionou na roça, sabe o que isso quer dizer. Hoje ainda as coisas melhoraram muito com os meios de comunicação e certo conforto… Mas há algumas décadas, nas distantes escolinhas, o professor era um autêntico pioneiro, um herói obscuro, enfrentando o desconforto, a hostilidade, a incompreensão do meio, o isolamento do resto do mundo. O salário era quase de fome; as escolinhas muito pobres, sem luz, sem água, com precaríssimo material escolar.
Sabemos de professores de roça, que só atingiam suas escolas, vencendo, a cavalo, a pé ou de charrete, longas distâncias. Na zona litorânea, muitos tinham de remar frágeis canoas através de canais pestilentos. Muitos tinham de enfrentar a má vontade, a intolerância de fazendeiros, donos de terra e chefes políticos ignorantes e autoritários. Mas o professor acabava por vencer as resistências, conquistando terreno, palmo a palmo. Em pouco tempo fazia amizades e se impunha pelo dinamismo e boa vontade.
Está para ser escrita ainda a Saga do professor de roça e de se relatar o seu heroísmo obscuro e construtivo.
A longa estrada
Da escolinha rural, transferiu-se o Professor Landell para a escola isolada de Conchal e mais tarde para uma outra escola em Mogi Mirim. Estas etapas já representavam passos decisivos em sua carreira. Sendo também dentista, conseguiu trabalho no grupo escolar Orosimbo Maia, em Campinas. E quando, tempos depois, o professor João Dutra do Colégio Culto à Ciência, também em Campinas, pediu afastamento, o professor Landell foi substitui-lo.
Em 1943 com a realização dos concursos instituídos pelo Governo Estadual, ele inscreveu-se nos mesmos, conquistando duas cátedras. Esta vitória foi o ponto alto de sua carreira profissional, toda marcada pelo seu esforço e talento.
Muitas gerações de estudantes passaram pelas mãos deste mestre distinto, calado, sóbrio, eficiente, “gentleman“ da cabeça aos pés. E gerações aprenderam com ele, além das lições de Desenho Geométrico e Artístico, também a sua mensagem de estetas e de artista verdadeiro.
Porque o professor Landell alia às qualidades didáticas, um elevado senso de beleza e de inspiração? Suas esculturas e modelagens são obras primas de harmonia, bom gosto e pureza de linhas.
Da Família
Descendente de escoceses e portugueses, mas nascido na cidade dos milagres, Tambaú, no estado de São Paulo, o professor Landell é sobrinho de um dos homens mais geniais que o Brasil teve: o inventor padre Roberto Landell de Moura, investigador infatigável, homem que vivendo muito além de seu século, inventou a lâmpada de três eletrodos, a telefonia e a telegrafia sem fio, o microfone moderno e muitos outros aparelhos.
Foi o padre Landell uma figura singular, vítima da ignorância e do preconceito da época, um sábio que conhecia Matemática, Biologia e Psicologia, que teve vários inventos reconhecidos nos Estados Unidos e que muito antes de Marconi, já havia efeituado, com êxito, experiências no campo da telecomunicação.
Os trabalhos deste invulgar homem de ciência, que lutou contra as mais adversas circunstâncias, mereceram brilhante estudo do escritor gaúcho Hernani Fornari, que contém um apelo ao tribunal da opinião pública brasileira, pleiteando lugar de honra na história da radiotelegrafia e da radiotelefonia ao nosso genial patrício.
Muito Parecidos
Os velhos retratos do ilustre inventor Padre Landell de Moura mostram traços fisionômicos parecidos com os do seu sobrinho professor Ignácio Landell. O conhecimento do perfil intelectual de ambos também demonstra muita semelhança: a mesma firmeza de atitudes, muito talento e espírito de pesquisa. Em ambos, embora separados pelos anos, o mesmo amor aos estudos, à dignidade de atitudes, ao trabalho.
Infelizmente poucos brasileiros conhecem esta história triste de um inventor tão importante. Hoje, ele é o Patrono dos Radioamadores. Na cidade de Campinas, em uma das saídas para outras cidades, há um edifício a ele dedicado: Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Padre Roberto Landell de Moura.
Observação – Maria Helena Landell (autora do Blog)– Quanto ao Professor Ignácio Carvalho Landell, era voz geral dizendo: “Quem em Campinas não foi aluno deste professor?”.
